Caminhava o bravo guerreiro perdido e atormentado
pelo Vale dos Lobos, após a batalha os poucos que sobraram se dispersaram, e
ele estava entre aqueles que saíram feridos e aterrorizados pelo jorrar do
sangue que ali se deu. Frente aos seus olhos nada além da trilha inóspita e
saudosa dos últimos que ali passaram, tampava o olho ferido com um pedaço de
pano encontrado em meio ao caos, apenas restando o outro para tentar enxergar o
caminho neblinado pela frustrante derrota. Caminhou sem rumo algum, pois que
pouco sabia sobre o lugar em que estava.
O frio e a solidão o acompanhavam assim como os
morcegos acompanham a escuridão, pouco se entendia, muito se pensava, naquele
momento o tempo já não fazia mais sentido, os segundos não existiam, os minutos
constituíam uma escala de um passado distante. Não imaginava que sentiria tanta
falta daquelas que o esperavam em casa, no pequeno condado, provavelmente desfrutando
do indispensável calor da lareira que muito trabalhava naqueles tempos que
antecediam o inverno.
Perguntas ficavam no ar, os amigos que ficaram
para trás, a certeza da vitória massacrada pela espada inimiga, tudo o fazia
lembrar daquele dia de terror em que pela primeira vez sentiu o pesado revés
que pode surpreender o mais hábil dos combatentes e o mais perspicaz dos
generais. Continuou sua jornada já confuso entre a loucura e a realidade,
cambaleava sentindo na boca a lembrança do inesgotável prazer de uma pequena
gota d’água nos momentos de agonia e restrição. Não desistia, e dentro da
desordem de seus sentimentos se sustentava uma fé que parecia ser inabalável.
Ao cruzar imensurável trajeto avista um pequeno
vilarejo formado por poucos casebres, alivia os sentidos e caminha com o que
sobrou de energia daquele coração que ainda pulsava para que ele pudesse sentir
cada pequena sensação promovida pelo sofrimento. Adentra o vilarejo e se dirige
sem firmeza à pequena fonte central, mergulhando a cabeça na fria água de
outono e fornecendo ao corpo aquilo que tanto ansiava. – Água! – Exclamou por
dentro. Nunca esta fonte de vida cumpriu tanto o seu papel como naquele momento
de martírio.
Observado com curiosidade pelos aldeões, foi abordado e acolhido por uma família, longe de toda nobreza, mas bem próxima do mais puro amparo cristão. Foi recebido, alimentado, teve seus ferimentos bem cuidados, e pôde enfim descansar depois da brava odisseia. Adormeceu ainda fora de si, e foi surpreendido por cenas macabras daquele dia que dificilmente deixará sua sofrida memória, mas conseguiu descansar, e aos poucos revitalizara o corpo cansado. Dali por diante, sua jornada não mais seria pelo Vale dos Lobos, mas sim pelo vale interior que o atormentava a alma e o roubava a expectativa pelo dia posterior.
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