sexta-feira, 16 de novembro de 2018

O ser-humano é imperfeito e vacilante, e isto deveria nos dizer muita coisa


Durante a maior parte da história de nossa civilização, as pessoas tinham plena consciência de que o ser-humano era uma criatura limitada. A doutrina do pecado original, tanto familiar aos cristãos, formava a base imaginária que sustentava uma posição de humildade e de uma visão de piedade sobre o mundo. Somos pecadores, somos miseráveis, somos imperfeitos e, portanto, devemos agir com calma e prudência. Por mais que houvesse barbaridades, elas eram julgadas por esta visão, além de uma consciência da existência de um ser supremo que vigiava tudo que fazíamos.

Com o advento do mundo moderno e do cientificismo, esta estrutura imaginativa foi substituída por uma crença demasiada na razão metódica, que sugeria a elevação do homem ao patamar de super-poderoso, um ser que tudo poderia fazer e tudo poderia entender, abolindo de seu dicionário conceitos simples e tradicionais como "mistério". A idéia de "mistério" para o homem moderno é uma idéia de mediocridade, devendo ser superada para que a espécie humana busque compreender a estrutura do universo, revelando o que "instituições retrógradas" - como a Igreja - impediam de ser revelado. Lembro aqui que cientificismo não quer dizer propriamente ciência natural, aquela prática muito comum entre padres e os fundadores das universidades ocidentais. Cientificismo é tomado aqui como uma espécie de ideologia, um embotamento mental resultado da elevação da ciência a uma condição de fonte monopolista de toda verdade e conhecimento (o que explica o enfraquecimento da filosofia clássica nos últimos trezentos anos).

Esta quebra de mentalidade se alastrou pela civilização, deixamos Deus de lado, negamos as limitações do homem e o colocamos como o grande redentor da espécie. Transformar este planeta em um paraíso não seria tão difícil assim com grandes mentes no comando. Tal crença, aliada à consagração do materialismo tanto por marxistas quanto por alguns burgueses, conduziu-nos a ideologias políticas que resultariam em graves instabilidades, tendo como pontos máximos as duas grandes guerras mundiais do século XX, além da revolução bolchevique de 1918. Para o historiador Arnold Toynbee (1889-1975), esta foi a era da desordem. Nunca antes na história humana a vida foi tratada de forma tão insignificante, vista como um empecilho para a construção de mundos "perfeitos" que desconsideravam presunçosamente todas as grandes lições da história, assim como a compreensão da natureza humana, entendida com muito gênio e sacrifício ao longo de vários séculos. Milhões de vidas foram ceifadas na Europa, em especial na Alemanha e na Rússia, e mais tarde também na Ásia, tendo como protagonista a China de Mao Tsé-Tung (1983-1976). 

Mesmo com toda esta barbárie do século XX, é comum ainda termos a idade média como a principal época da "escuridão" e do sofrimento humano, e esta visão parte muito mais por iniciativas propagandistas modernas do que pela realidade histórica registrada. É assustador como o terrores do comunismo, por exemplo, são tratados com tanta brandura por pessoas que se autoproclamam "humanistas", como se esta ideologia só precisasse de alguns reparos para que fosse colocada em funcionamento de forma mais satisfatória. A verdade é que, mesmo com todos os fatos históricos observados, ainda esperamos que o homem cure as chagas deste mundo e proporcione o "Céu na Terra". Tal pensamento não só nos reveste de utopia - o que na prática nos idiotiza - como gera um ambiente muito propício à ascensão de tiranos e demagogos que usarão tais equívocos filosóficos para conquistarem o poder. Quando o homem se torna um louco em seu interior, e esta loucura se torna o norte cognitivo das massas, é só questão de tempo para que loucos se tornem governantes.

Ainda hoje, mesmo com a queda de várias destas ideologias, líderes cheios de planos mirabolantes para salvar o mundo ainda são escutados, respeitados e até eleitos para cargos de grandes responsabilidades. O que podemos esperar é que aqueles que ainda preservam a sanidade, possam perceber que contar com a salvação da humanidade pela própria humanidade é uma tremenda armadilha, e que o resultado tende a ser muito pior do que a mera manutenção da ordem, da justiça e da liberdade, no sentido clássico das palavras. Se aceitarmos a realidade e as limitações do homem, podemos lutar por um mundo razoavelmente bom, onde há um alto nível de tolerância e a justiça e a liberdade podem prevalecer, mas se cairmos em armadilhas ideológicas, podemos perder tudo isto de uma só vez. Nas palavras de Friedrich Hölderlin (1770-1843): "O que sempre fez do estado um verdadeiro inferno foram justamente as tentativas de torná-lo um paraíso". Tenhamos em mente, antes de qualquer coisa, que não somos Deuses, e temos muito o que aprender. Apenas isto já seria suficiente para acalmar os ânimos de um mundo em constante e exaustiva ebulição.

quinta-feira, 15 de novembro de 2018

Porque deixei de ser vegetariano



Antes de discorrer sobre os motivos que me levaram a abandonar três anos como vegetariano, devo dizer que provavelmente frustrarei alguns "inimigos" do vegetarianismo que esperam alguma descrição catastrófica dos efeitos biologicamente destrutivos de não se alimentar de carne. Estes amigos buscam vorazmente relatos de indivíduos que ficaram "doentes" após um tempo adotando uma dieta vegetariana. Bom, este não é meu caso, não fiquei "doente" e não foi por motivos de saúde que abandonei este estilo de vida.

Devo destacar, inclusive, as vantagens de ser vegetariano. Uma dieta sem carne, conduzida por alguém bem educado sobre alimentação, pode melhorar e muito a qualidade de vida, a saúde e a performance nos esportes. Normalmente os vegetarianos bem empenhados acabam tendo uma alimentação muito superior à de um cidadão médio, uma vez que reconhecem suas restrições e aprendem a se alimentar melhor, tendo uma relação mais íntima com o que ingerem, buscando mais informações sobre os benefícios e malefícios de cada alimento.

Portanto, minha decisão por deixar o vegetarianismo não é de cunho biológico, não tive nenhum problema físico ao deixar de comer carne, pelo contrário, tive muitos ganhos, como alta imunidade contra doenças, bom sono, melhora nos processos digestivos etc. Entretanto devo deixar o alerta aos aventureiros, para ter este estilo de vida não basta deixar de comer carne, você deverá saber substituir sua velha dieta e passar a comer muitos alimentos com os quais não tinha tanta familiaridade, como frutas e verduras que não costumavam fazer parte do seu dia a dia.

Pois bem, o que me trouxe de volta para a alimentação "comum" foi um aspecto cultural, mais precisamente algo que passei a chamar de "custo social". Alguém que pensa em se tornar vegetariano no Brasil deve ter consciência de que vive em uma cultura onde o consumo de carne está profundamente arraigado, de forma tal que muitas tradições e costumes estão vinculados a esta prática, havendo um alto teor de questões de sociabilidade envolvidas em qualquer decisão que gire em torno da alimentação.

A alimentação não é só uma decisão sobre o que vamos ingerir para nutrir nosso corpo, mas algo que remete fortemente à nossa participação na sociedade. Coisas como "tomar um café" ou "fazer um churrasco" no Brasil significam muito mais que um "café" ou um "churrasco", são códigos de convivência intimamente ligados à nossa história e à nossa identidade como povo. Em alguns países, um estrangeiro que se recusa a experimentar a comida local automaticamente é rejeitado, como alguém que não se pode confiar, ou mesmo como um inimigo. Por mais que preguemos uma sociedade tolerante, poucas coisas são mais frustrantes do que receber alguém na sua casa e esta pessoa ter um tipo de alimentação completamente diferente da sua, você tem dificuldades em saber o que pode servir ou como agradar este visitante. Quando esta pessoa tem um discurso moralista, isto pode ficar ainda mais inconveniente.

Quando um brasileiro decide ser vegetariano, ele deve ter consciência de que está promovendo uma violenta ruptura com a cultura em que está inserido. Isto pode soar até como uma novidade para alguns, mas isso acontece porque tentamos acreditar que estamos em um mundo onde as escolhas são muito livres e todos devem acatar o que decidimos fazer com nossas próprias vidas. Tal idéia pode ser verdade na teoria, mas a realidade prática não se importa muito com teorias. A tendência para uma pessoa "excêntrica" é que ela seja aos poucos excluída daquele núcleo cultural em que determinada população vive, núcleo cultural que não adianta ser ignorado, pois costumes alimentares são parte indispensável na composição das convenções de uma nação, e o consumo de carne faz parte da história do Brasil.

Em outras palavras, ao decidir por um estilo de vida vegetariano, você está decidindo por uma ruptura cultural, e isto pode ter como consequência uma gradual exclusão social. É claro que é possível buscar outras pessoas com um estilo de vida semelhante e tentar se relacionar (principalmente se você estiver em uma cidade grande), mas isto provavelmente resultará em uma esfera de interações muito limitada, o que moldará sua vida e seu destino de forma decisiva. Pode parecer exagero, mas a decisão por um estilo de vida alimentar tem impactos tão fortes quanto à conversão a uma determinada religião, ou mesmo à escolha de uma carreira profissional. É coisa séria, muito séria.

Além disso tudo, particularmente também acredito que há algo transcendente no compartilhar de uma refeição, algo que não está tanto ao nosso alcance compreender, mas tem tudo a ver com amizade, lealdade, companheirismo e celebração. Partilhar um alimento vai muito além de meramente se alimentar, tendo ligação íntima com a construção de vínculos que podem ser duradouros. Deixar de participar diretamente do churrasco, compartilhando a mesma carne que os outros estão degustando, e ficar no cantinho do evento comendo uma "alternativa" vegetariana, impõe um distanciamento metafísico insuperável entre a maioria e sua conduta particular. Por mais nobre que sejam seus motivos, como proteger os animais, você está implicitamente declarando que não pertence àquele grupo.

Devo deixar claro que não estou dizendo que sou contra o vegetarianismo, apenas penso que aqueles que querem adotar este estilo de vida, devem ter em mente o "custo social" de tal empreitada. Às vezes não é fácil ser um "herege" alimentar, e se você for jovem então, acaba sendo pior ainda, pois jovens tendem a ter uma vida social mais movimentada, e deixar de ter vínculos nesta idade poderá lhe conduzir a uma maturidade solitária. Uma alternativa que deixaria como sugestão, caso alguém queira deixar de comer carne, é reduzir a quantidade consumida deste produto drasticamente, mas não proceder com uma ruptura total com a dieta "comum", desta forma, haverá um meio termo, ideais podem ser alcançados e vínculos sociais podem ser conservados.

Não me arrependo de ter deixado o vegetarianismo, apesar de também achar que o brasileiro come carne demais e deveria aprender a consumir outros grupos alimentares. Voltando a viver nos costumes, reaproximei-me de amigos e familiares, além de fazer novas amizades em situações onde o alimento era protagonista no cenário das interações. Eventos sociais que envolvessem comida nunca mais foram um problema, de forma que minha energia mental (antes preocupada com "o que comer") fosse redirecionada a outros problemas e desafios, como por exemplo ser alguém mais agradável, tolerante e cortês, coisas que exigem certo esforço, disciplina e aprimoramento individual. Portanto, saiba que ser vegetariano tem várias vantagens, mas não esqueça desse negócio chamado "custo social", isto é sem dúvida algo que deve entrar em suas meditações sobre o assunto antes de tomar qualquer decisão.

quarta-feira, 14 de novembro de 2018

Se você abrir muito a cabeça, o cérebro pode cair para fora

Estou retornando à minha casa à noite quando passo por um desses grafites urbanos com frases de efeito. Neste, um menino negro tem um balão de diálogo que diz: "O impossível é uma questão de opinião". Como sou desses que gosta de ficar filosofando sozinho no carro, começo a refletir sobre a frase e pensar nas suas consequências cognitivas.

É muito comum em nossos tempos frases de efeito que nos convidam a um certo comportamento questionador, sempre nos incitando a destruir os limites da vida, como se isso nos conduzisse a níveis mais elevados de compreensão e nos diferenciasse das "massas alienadas que estão sempre seguindo padrões". É um convite a ser diferentão, ouvimos isso tanto de gente "cabeça" de esquerda como de empreendedores e coaches entusiastas que estão sempre gritando por aí seus mantras para uma carreira bem sucedida: "pense fora da caixa!", é o que o mundo moderno insiste em nos dizer.

No caso do grafite que vi voltando para casa, a mensagem é bem clara: "não respeite sua noção de impossível". Também poderíamos ler como: "ignore as limitações da realidade". Você quer voar? Voe! Você quer riqueza sem trabalho? Queira! Você tem muitos desejos? Satisfaça-os. Não importa se a vida real é cheia de condições, muitas vezes insuperáveis, você tem todas as possibilidades de subvertê-las, basta querer!

Esta ânsia do homem moderno em destruir os limites foi muito bem observada por G.K. Chesterton, um escritor inglês que, dentre muitas frases célebres, tem uma das minhas favoritas: "Não seja tão mente aberta que seu cérebro caia pra fora". Chesterton lamentava a forma como seus contemporâneos passaram a encarar o mundo e a aquisição de conhecimento, para ele, a vida é feita de contornos, e retirando os contornos, a vida deixa de ser vida.

Não adianta você querer uma zebra sem listras, se ela não tiver listras, ela deixará de ser zebra. Não adianta desejar um leão sem juba, ao perder sua juba, o leão deixa de ser leão. Da mesma maneira, nossa vida é repleta de coisas já estabelecidas, e lutar contra elas é um grande passo a caminho da loucura e da insanidade. E é este um dos grande males que nossa civilização parece estar sofrendo.

O homem medieval buscava melhorar a vida, mas com um enorme respeito às coisas como elas são em seu sentido concreto, já o homem moderno zomba da realidade com extrema arrogância, colocando seus desejos e seu ego no topo das prioridades. O homem medieval era movido pela piedade, o homem moderno é movido pelo apetite.

Basta olhar ao redor e perceberemos que nosso mundo está movido por uma busca insaciável de atender a desejos de um lado, e uma insanidade irrefreável do outro, sendo esta campanha permanente de relativizar a realidade uma das principais causas da desordem interna que empurra as massas para o precipício. Em outras palavras: o que era apenas um convite para "pensar fora da caixa" se tornou um dos maiores dogmas desta nova religião da loucura e do caos metafísico.

Desconstruir, problematizar, quebrar paradigmas, parece que ninguém mais pode sentar em uma praça em paz e apreciar as coisas como elas são. Ver os velhos tagarelando, os vendedores anunciando suas ofertas, os apressados correndo, os mendigos pedindo esmolas. Nossos jovens estão sendo treinandos para fazerem análises sociológicas profundas das coisas mais banais, e muito comumente eles só reproduzem um monte de clichês e jargões marxistas para justificar algum remédio político que ouviram de um professor ou algum formador de opinião na internet. 

Compreender o mundo como ele é, ao invés de ficar se debatendo contra a realidade, é um dos principais caminhos que levam à sabedoria, assim como a uma vida mais feliz e perene. Revoltar-se contra tudo é abrir os portões a um verdadeiro inferno existencial, alimentando o monstro da insatisfação e cavando a própria cova da inteligência. O sábio não vive de revoltas e utopias, mas de um imenso entendimento de como as coisas funcionam, além de um permanente encantamento com tudo que seus olhos veem, como se os atributos aparentemente mais irrelevantes da existência fossem verdadeiros milagres. 

Abrir tanto a cabeça ou ficar questionando o impossível não lhe levará a um lugar muito mais interessante que esta fantástica aventura onde você já se encontra: a aventura da vida comum, a inigualável experiência de ser mais um. Somos muitos, mas cada um de nós é um milagre, assim como cada contorno que nos é imposto. Nosso tempo é curto, para quê desperdiçá-lo com excentricidades? Amemos as coisas como elas são. Voltarei lá no grafite para apagar a frase "o impossível é uma questão de opinião" e escrever: "o impossível é impossível e pronto". Desculpe se frustrei sua poesia, mas acho que vai ser melhor para você.

sexta-feira, 26 de outubro de 2018

Porque votarei em Bolsonaro

Não pretendo convencer ninguém, até porque a distância ideológica entre mim e alguém que votará em Haddad é muito grande para ser revertida em um só texto. Mas tentando ser objetivo para não tomar muito seu tempo:

- Não comungo de nenhuma forma com classificações de personalidade segundo gênero, cor e orientação sexual, por isso reprovo muito do que o candidato disse, embora o que foi dito tenha sido insistentemente tirado de contexto e maximizado pelos seus adversários para fins de combate político.

- O terror em volta de Bolsonaro como uma ameaça a determinados grupos da sociedade é artifical, trata-se de narrativa previamente orquestrada, uma vez que as ideias políticas da esquerda só prosperam em ambientes de grande fragmentação, e o termo "minorias" é pensado justamente para este fim. Quem está preso neste grande jogo de narrativas, naturalmente verá o candidato como o mais tenebroso dos seres. Não estou nessa.

- Apesar do poder executivo federal não agir na área diretamente, Bolsonaro é a única esperança para que a União sinalize aos Estados um ambiente mais propício ao fortalecimento da segurança pública, que está em calamidade total, enquanto Haddad segue com aquela postura complacente com a criminalidade, sem dar nenhum indício de que poderemos um dia vislumbrar ruas e áreas públicas seguras em nosso país. 

- Não há nenhuma ameaça à democracia, nós não estamos em 1964, a Guerra Fria acabou e não temos um inimigo interno explodindo bombas e sequestrando gente por aí. A única ameaça que a democracia tem nesta época é seu aparelhamento por um partido hegemônico que vai cooptando as instituições ao ponto de não ter mais seu poder ameaçado, e você sabe bem quem fez isso nos últimos quinze anos (até o Ciro Gomes sabe).

- A educação brasileira está completamente aparelhada ideologicamente, sendo utilizada de forma criminosa para articulação política e engenharia social, isso atrasa muito o país (além de ser um grande desperdício de dinheiro). Bolsonaro pode ser o início de uma mudança, atuando para quebrar esta estrutura em nível nacional, começando pelas universidades.

- Bolsonaro praticamente não tem um plano de governo, apenas propostas soltas, o que é ótimo, o país precisa de um pouco de senso comum, fazer as coisas óbvias e parar de achar que planos de governo super racionais e detalhados inferem resultados melhores. Em política, não fazer muito e não se meter em tudo são propostas dignas de apreciação.

- Não precisa falar sobre posse de armas, o brasileiro já votou contra o desarmamento. Aqueles que ainda assim resistem, demonstram só respeitar a democracia quando convém.

- Há uma sinalização para efetivação real de nossa federação, reduzindo o poder da União e fortalecendo estados e municípios, menos poder em Brasília, mais poder para perto das pessoas.

- Economia deve ser o menos necessário em comentar, Bolsonaro sinaliza para um economia mais livre: maior abertura comercial, desregulamentações, desburocratização, redução de impostos, responsabilidade fiscal, reformas necessárias, estabilidade monetária, câmbio flutuante, privatizações, enxugamento do Estado (que impacta na redução da corrupção) etc. São propostas tão mais realistas e sensatas que nem dá pra comparar com as do soviético que está no outro lado da disputa.

- Na política externa Bolsonaro também sinaliza um realinhamento drástico, abandonando as parcerias ideológicas da última década e se aproximando aos países civilizados, o que melhora substancialmente o posicionamento geopolítico do Brasil, visando ganhos incomensuráveis em termos econômicos, diplomáticos, militares e sociais. Como nosso país é um líder regional, isto também terá impactos na ditadura venezuelana, que há muito tempo se transformou em uma grave crise humanitária.

Os motivos acima já seriam suficientes para fundamentar os votos em Bolsonaro, e não meramente por um "ódio ao PT". Votei em João Amoêdo no primeiro turno, que tinha propostas mais claras e até melhores, mas no segundo turno não tenho dúvidas, Bolsonaro representa a civilização (por mais bufão que seja) e Haddad representa a estagnação no subdesenvolvimento, eternizando nosso país na periferia do mundo. 

Pronto, simples né? Pois é, também gostaria que nossa política ficasse mais simples, daria menos espaço para corrupção e utopias destrutivas. Pena que a simplicidade não faz parte do vocabulário de quem acha que vai mudar o mundo pelo Estado.

domingo, 26 de agosto de 2018

A ditadura da subversão e a intolerância dos tolerantes

Liberdade de expressão parece que é uma daquelas coisas que acabou se tornando uma espécie de dogma moderno. Quase não há quem diga que é contra a liberdade de expressão, e se há, estas pessoas tentam não se manifestar a respeito. Liberdade de pensar e dizer o que pensa é o que se vê entre as bandeiras de muita gente que têm certeza que são seres progressistas e muito mais "mente aberta" do que a média da população. Será?

Algo que tem se tornado cada vez mais perceptível é que boa parte destas pessoas que se dizem "liberais" e "mente aberta" têm uma extrema dificuldade em se portar frente a posições de opinião que divergem das delas. "Eu defendo que as pessoas sejam livres", dizem, mas basta o seu Joaquim Teixeira dizer que não gosta de algo que elas gostam e já ficam extremamente enfurecidas, como se uma simples opinião individual fosse um posicionamento autoritário e coercivo.

Grupos que se consideravam "marginalizados" pela sociedade, galgaram posições de poder e espaço pregando a tolerância frente às diferenças e convencendo uma sociedade conservadora a se abrir para o novo, aceitando aqueles que optavam por estilos de vida que iam de encontro com a cultura tradicional vigente. Eles chegaram lá, reinvidicaram suas liberdades, geraram a ruptura que tanto queriam e então todos poderiam ficar em paz, certo? Não foi bem assim.

Os grupos que antes se utilizaram do discurso da tolerância para serem "deixados em paz", o que é algo justo, não pararam aí. Continuaram atuando de forma a desarmar todo o arcabouço tradicional da sociedade que os ofereceu um espaço, comportando-se como verdadeiros agentes subversivos, querendo virar tudo de pernas para o ar, não só atuando de forma ativa para alterar todos os padrões consagrados pelo tempo e pela luta da sobrevivência, mas também censurando de todas as formas possíveis aqueles que se recusam a se adaptar a tal estilo de vida.

Em outras palavras, a sociedade tradicional se abriu para as virtudes do liberalismo moderno, mas os grupos que ascenderam ao poder solapando os valores tradicionais estão pouco se lixando para estas mesmas virtudes que permitiram sua própria ascensão. Não basta a eles terem a liberdade de falarem e serem o que são, é preciso substituir toda a ordem cultural vigente, fundando um total novo estilo de vida, que havia sido introduzido como "subversão", mas que busca se estabelecer como ordem hegemônica. Eis o porquê da fúria contra o cidadão comum que se posiciona contra as "novidades" que parecem ser impostas todos os dias por variadas máquinas de propaganda que se estabeleceram a partir do período pós-guerra.

Estes grupos subversivos que vêm conquistando cada vez mais espaços costumam ridicularizar as visões dogmáticas e todo o senso de orientação que havia conduzido o homem comum até aqui, o problema é que mal percebem que já há algum tempo eles estão se tornando fundadores de novos dogmas e referências existenciais, fundando, na prática, uma religião alternativa, que ganha corpo na fusão de inúmeras ideologias modernas, e à medida que assumem posições de poder, mostram-se até mais autoritários do que a ordem tradicional que buscaram suplantar apoiados no discurso da "liberdade".

Portanto, muito cuidado com aqueles que saem por aí brandando a "luta pela liberdade", a "tolerância" e o "amor", palavras que têm seus significados paulatinamente alterados de forma a servir melhor os desígnios ideológicos já traçados. Quando alguém diz que é "tolerante" e fica enfurecido com uma opinião muito diferente, pode ir desconfiando que as sementes do totalitarismo já germinam por ali.

sábado, 25 de agosto de 2018

Você não tem controle sobre a vida de outras pessoas

Há um certo vício humano que já há algum tempo tem chamado minha atenção devido ao nível de conflitos e sofrimento que tende a gerar em relacionamentos das mais variadas natureza. Pais e filhos, esposos e esposas, amigos, empregados e empregadores etc. O vício consiste em acreditar que se tem controle sobre a vida do outro, uma sensação de exacerbada responsabilidade frente às questões do próximo, que muitas vezes pode ser movida por bons sentimentos de carinho e proteção, mas que tende a cair, fatalmente, num cenário obsessivo de incondicional tutela, muitas vezes chegando a níveis de um truculento autoritarismo (mais comum em relação de pais e filhos).

Logicamente, se remetermos a questão aos pecados capitais, teremos como "pecado-mãe" desta prática o orgulho, que se manifesta solapando os bons sentimentos de saudável proteção e incitando o indivíduo a impor sua crenças ao outro, cerceando a liberdade deste e tendo a falsa sensação de que está "tudo sob controle", ou melhor dizendo: "está tudo sob o meu controle". Tal condição mental conduz o "controlador" a níveis cada vez mais intensos de tutela, fazendo-o acreditar até que a sobrevivência do "controlado" depende dele, o que o faz assumir um comportamento cada vez mais autoritário, transformando uma relação que deveria ser de amor e carinho em uma prisão de tensão e frustração de ambos os lados.

Quando a proteção do próximo cruza os limites do bom senso, tanto o controlado como o controlador passam a sofrer, o primeiro porque sente que perde sua liberdade e passa a ser uma espécie de servo psicológico do outro, enquanto o segundo vai aos poucos deixando de viver a própria vida e passando a ter em mente apenas seu tutelado, e com um agravante, dificilmente este tutelado consegue cumprir todas as exigências de seu tutor, ou seja, no final está todo mundo desiludido, desgastado e muitas vezes deprimido.

Se você insiste em controlar a vida de outras pessoas, pare, você está gerando sofrimento tanto para elas quanto para você. É justo você se preocupar com alguém que ama, mas esta preocupação deve ser exercida de maneira moderada, sem restringir a liberdade do outro (a não ser que seja um incapaz). As pessoas devem ser livres para errar, para sofrer, para cair, para "passar vergonha" e para amadurecer por conta própria, ficar tutelando todos os aspectos do desenvolvimento do outro, além de prejudicá-lo, também vai acabar com você. Deixe-o errar, deixe-o viver.

De forma semelhante, aqueles que são plenamente capazes e mesmo assim forçam uma dependência a outras pessoas, por mera comodidade, também devem tomar uma atitude e parar de sobrecarregar seus próximos. Este é o grupo das pessoas que estão sempre necessitando da atenção do outro, seja de forma emocional ou até monetária. Se você acha que está neste grupo, entenda que ficar esperando o amparo dos outros é uma péssima ideia, você estará deixando de desenvolver sua autonomia e estará sempre criando expectativas nos outros.

Não quero propor aqui algum tipo de utopia onde todos são livres, autônomos e independentes. Reconheço que durante a vida vamos criando laços e vínculos que oscilam de intensidade dependendo das cicunstâncias. Mas busco chamar a atenção para a necessidade de se ajustar melhor a estas circunstâncias. Talvez aquela pessoa que você acha que depende de você já está pronta para ter mais liberdade, então é hora de dar um passo para trás. Talvez o controle que você exerce na vida do outro pode ter sido importante em algum momento, mas agora pode estar fazendo mal para ambos. Da mesma forma que um gestor realoca seus recursos de acordo com as oscilações de mercado, nós precisamos adaptar nossas formas de agir de acordo com o que está acontecendo, tendo consciência de que a realidade está sempre nos convidando à mudança.

Acima de tudo, "deixar viver" é uma questão de humildade, de entender que não estamos no controle, de que somos muito menos capazes do que eventualmente pensamos que somos, de que os outros precisam de liberdade e que mesmo que errem, não somos nós os responsáveis por impedir que errem. Tal lógica pode ser aplicada tanto à psicologia, como também às ciências sociais e à teoria geral do Estado (campos de estudo que tenho mais familiaridade). Moderar suas ações sobre a vida de outras pessoas não é uma tarefa fácil, exige certa sensibilidade e muito cuidado para não cair nos extremismos, mas à medida em que aprendemos a nos comportar melhor, vamos notando como nossos relacionamentos também melhoram, fazendo com que todos ganhem um pouco.

domingo, 19 de agosto de 2018

Assuma seus problemas e pare de reclamar

Outro dia ouvi uma pessoa contando a história de um rapaz que era muito inteligente, mas era insatisfeito com a própria vida. Este rapaz tinha uma relação difícil com seu pai, e costumava reclamar muito a respeito, muitas vezes atribuindo ao pai uma série de coisas que fazia parte de sua realidade como adulto. Dizia que o fato do pai ter uma personalidade "difícil", fez com que ele adquirisse certas características que explicavam muito de sua insatisfação.

Atribuir aos pais diversos de nossos problemas como adultos é uma coisa extremamente comum. Mal posso contar o tanto de pessoas que já ouvi falando sobre os problemas que partiram de uma "relação complicada" com os pais. "Minha mãe era assim, por isso eu sou assim". "Meu pai fazia isso, por isso eu acabei nessa". Parece que pai e mãe são excelentes bodes expiatórios, afinal estão ali por perto, costumam continuar nos amando mesmo quando não somos os melhores filhos e muitas vezes acabam aceitando a teoria que jogamos pra cima deles.

Mas este texto não é sobre "culpar os pais", e sim sobre este vício que as pessoas têm em atribuir todos os seus problemas a agentes externos. Considero esta prática extremamente perversa consigo mesmo, por isso a importância de refletir sobre o assunto. É, sem dúvida, muito mais fácil culpar os outros sobre aquilo que você considera um problema, evitando fazer uma auto análise e dar início às reformas que todos nós temos que operar durante esta vida, por isso, talvez, seja uma prática tão comum.

O esforço em fugir da responsabilidade frequentemente chega a níveis de articulação monumentais, demonstrando que o indivíduo teria até a capacidade de buscar soluções, mas ainda assim acaba preferindo dar um jeito de culpar o outro ou outra coisa. Esta "arte de fugir das responsabilidades" pode ser percebida em muita gente, mas é, acima de tudo, uma característica da infância. Crianças estão sempre buscando culpar os outros sobre coisas que elas sabem que elas mesmas fizeram, é algo natural, algo da infância, e estranho seria se não fosse assim.

Acontece que esta mania infantil acaba seguindo ativa em muita gente mesmo depois de chegar à idade adulta. Não são poucos os adultos que são extremamente infantis neste aspecto, nunca assumem responsabilidades, nunca tomam a frente, sempre fogem e buscam bodes expiatórios para tudo. Quando consideram que suas vidas "deram errado", ficam andando pelos cantos, chorando e lamentando o fato de que "aquilo" ou "aquela pessoa" fez com que sua situação de vida chegasse àquele ponto.

Esta atual nova geração de adultos em especial, que alguns estão enquadrando como "millenials", está sempre a procura de "algo" ou "alguém" que explique sua infelicidade. Pode ser algo pequeno e próximo, como uma pessoa, ou algo maior e muito mais amplo, como o sistema econômico e social vigentes. Estão sempre em busca de inimigos externos, ao mesmo tempo que demandam do mundo uma série de exigências que consideram justas e importantes, e que eles merecem simplesmente por estarem vivos.

Mas esta é só uma geração que levou o vício um pouco mais além. No geral, as pessoas fazem isso, não importa de que geração elas vieram. Estão sempre culpando algo, e isto é um caminho fatal para o cárcere do sofrimento. Durante a vida somos constantemente surpreendidos com situações adversas, estas situações geram cenários de crises, e cenários de crises nos obrigam a mudar. O problema é que se não associarmos a crise a nós mesmos - como seres que podem se adaptar a quase tudo - nunca compreenderemos que devemos mudar, estacionando em determinada condição e buscando culpados. Tal pratica é tão perversa que além de não detectarmos onde temos que mudar, permanecendo em crise, ainda colocamos a carga do problema em outras pesssoas, fazendo mais gente sofrer junto (muitas vezes tal prática é percebida em grupos com várias pessoas, com todos jogando suas responsabilidade uns para os outros, gerando um ciclo de estresse e sofrimento interminável).

Isto é muito comum, chegando a ser rara aquela pessoa que simplesmente assume tudo e traz a responsabilidade para ela mesma (uma espécie de herói psicológico), esta pessoa precisa se esforçar muito para encontrar soluções, adaptar-se e superar aquilo que parecia insuperável, mas depois que faz isso tudo, acaba se tornando um ser bem diferenciado, marcado por sua força, destreza e capacidade de lidar com os desafios de forma muito mais serena e resoluta, enquanto aquele outro que fica culpando os outros, torna-se cada vez mais fraco, desesperado, ansioso e depressivo, sem entender porque ele não consegue sair daquela situação.

Colocar-se a frente e assumir seus problemas e, muitas vezes, o problema dos outros, é a grande marca da maturidade, verdadeira postura daqueles que podem ser considerados livres, autônomos e até autosuficientes. Curiosamente tal postura não depende de idade ou situação, há pessoas que vivem em situações extremamente adversas mas são verdadeiros gigantes da personalidade, enquanto outras nascem em berço de ouro e vivem aprisionadas num eterno desgosto com a vida, como se fossem absolutas merecedoras da felicidade, sem que houvesse a mínima necessidade de fazer esforço para isto. Que possamos assumir nossos deveres, pois não há outro caminho para a liberdade.

segunda-feira, 23 de abril de 2018

A paciência e o diálogo com o possível

Se há algo nesta vida que uma hora ou outra teremos que aprender e aceitar de bom grado é a paciência. Lembro que quando era criança acordava muito mais cedo que meus pais e minha irmã. Ao sair da cama, deparava-me com uma casa vazia, com todos ainda recolhidos em seus quartos. Entediado e sem ter o que fazer, inventava distrações que pudessem me ocupar até que a casa começasse a se “movimentar”. Mas apesar dos meus esforços, o tempo passava devagar, e quando todos acordavam, parecia que eu já tinha vivido a metade daquele dia. Penso que foi nessas manhãs que comecei a ter a noção de paciência, que também chamaria de a “arte de esperar”.

Também durante a infância, minha mãe costumava ser uma das que mais demoravam para buscar eu e minha irmã no colégio. Ficávamos eu e ela no portão da escola por cerca de duas horas. Talvez não pareça muito, mas para uma criança esse tempo costuma passar bem devagar. Enquanto todos iam embora, nós ficávamos lá, entediados, sem mais nenhuma criatividade para inventar brincadeiras, aguardando até a hora de ir embora. Lembro-me bem dos dias que me sentia tão entediado que a vida em si parecia um completo vazio. Mas por incrível que pareça, essas lembranças que me remetem a um tipo de mortificação, moldaram o adulto que sou de forma melhor, criando em mim uma espécie de força e serenidade maior do que a média das outras pessoas. Com aquelas experiências, aprendi a esperar, coisa que muita gente nos tempos de hoje não sabem fazer muito bem.

O mundo moderno é apressado, ansioso e turbulento, e com a recente revolução digital promovida pela internet e pelos telefones celulares, todo este movimento se intensificou consideravelmente. Nesta época, somos não só bombardeados por um turbilhão de informações, como também extremamente cobrados para que acompanhemos o ritmo já instalado. O resultado é um desajuste entre a realidade e o plano virtual de possibilidades infinitas. Enquanto a vida real gira em torno de constância e persistência, o mundo moderno gira em torno de sobressaltos e estímulos que muitas vezes vão além do processamento psíquico humano. Precisamos da paciência, mas a corrida utilitarista nos encoraja à impaciência.

Durante a maior parte da vida humana estamos inseridos em circunstâncias em que nossa ação será pouco efetiva para a mudança. Podemos trabalhar por ela, mas existem conjunturas em que a mudança será um processo lento e gradual, forçando-nos a aceitar nosso estado de relativa impotência. Quando buscamos a todo momento alterar nossa realidade, ficamos consideravelmente irritados e insatisfeitos, enquanto quando temos paciência e praticamos a gratidão, acabamos convivendo melhor com o cenário real onde nos encontramos. Com paciência, temos paz, fazemos o possível e não nos apressamos. Sem a paciência, mantemo-nos em diálogo com o impossível, tentando encontrar atalhos e nos embaraçando em caminhos tortuosos que, muitos vezes, fazem-nos perder ainda mais tempo.

É válido observar a natureza, em toda sua beleza e complexidade, e perceber que tudo nela funciona com certa lentidão. Peguemos uma árvore, por exemplo. Ao meu ver, a árvore é um grande símbolo de paciência. Ela começa em uma semente, cria raízes, espalha-se pela terra, seu tronco cresce aos poucos, levando anos e anos para se tornar uma árvore madura. Depois de madura, ela permanece em estabilidade, dando seus frutos e nos presenteando com toda sua exuberância. É difícil ver uma grande e antiga árvore e não pensar em certa força, sabedoria, serenidade e experiência. Vai ver por isso os índios americanos atribuem às florestas tantos mistérios. Na estória lendária da índia Pocahontas, o oráculo que a aconselha e a auxilia é uma árvore (pelo menos na versão da Disney).

Mas a ideia de um vegetal fixo e enraizado parece não agradar muito o homem moderno, que está sempre a procura de novidades e estímulos externos, nunca se saciando completamente. Em um mundo assim, problemas como ansiedade e depressão continuarão atingindo níveis cada vez mais altos, tornando-se uma enfermidade generalizada. Não cabe a mim descrever uma solução para tais problemas, mas penso que aqueles que praticam a paciência, com o passar do tempo, adquirirão maior imunidade contra esses males, tendo maiores possibilidades de crescerem como admiráveis árvores, cultivando uma vida mais plena, estável e feliz. Portanto, pratiquemos a “arte de esperar”.

domingo, 22 de abril de 2018

A eterna insatisfação do homem moderno

Desde o tempo em que passei a me considerar um ser pensante, daqueles que analisam certos objetos e tentam estabelecer determinada lógica entre um fato e outro para estuturar algum tipo de cadeia racional de eventos e deduções, tenho registrado variações de rebeldia quanto ao mundo como ele é. Falo de uma rebeldia nas pessoas em geral, sempre relutando em aceitar a realidade da maneira como fôra posta. Criança levada, adolescente revoltado, adulto amargurado, parece haver alguma agitação mental em nossos tempos que tira a paz de qualquer sujeito.

Fala-se muito que as pessoas andam tristes, mas poucos falam do motivo da tristeza. Não creio que a felicidade está neste mundo, mas penso que podemos viver bem, carregando o fardo humano de bom grado, sem ficar resmugando pelos cantos como quem perdeu toda a esperança. Mas viver bem tem tudo a ver com a forma como enxergamos a vida; parece que criamos nosso próprio céu ou nosso próprio inferno, não importa quais sejam as circunstâncias. O homem moderno tem procurado o céu na Terra, e com isso sua vida tem se transformado em um inferno.

Temos sido estimulados além do suportável por todos os lados, tanto pela busca do prazer material promovido pelo consumo capitalista quanto pelas paixões ideológicas promovidas por todos que querem substituir a realidade por um mundo previamente pensado onde todos supostamente serão felizes. Queremos sempre algo diferente, cultivamos a insatisfação e logo abraçamos a ingratidão. Nunca existiu uma época tão abundante de recursos como hoje, todavia nunca estivemos tão tristes (você já deve ter ouvido isso diversas vezes).

Muitos colocam a riqueza como fomentador desta insatisfação, apontando o "dinheiro" como grande inimigo do bem-estar humano. Isto é um equívoco. A riqueza nos liberta das atividades primitivas e nos permite mais conforto para exercitar outras faculdades, e assim avançamos como civilização. Penso que o problema está na ânsia de escolher a riqueza como filosofia de vida, colocar as conquistas materiais como um fim, e não como um meio.

Ao focar no materialismo como fonte de felicidade, ficamos sujeitos a todo o caos desta realidade terrena, comemorando e lamentando de acordo com as oscilações da vida, como se tudo fosse uma bolsa de valores, sendo seu sucesso um gráfico de acumulação crescente. Olhamos para o que temos e, ao invés de agradecer a Deus por aquilo, pensamos em como podemos ter algo melhor, entrando em um ciclo eterno de uma busca que nunca saciará nossas almas.

De forma um pouco diferente também está a insatisfação do revolucionário, que revoltado com as circunstâncias de sua vida, crê que a destruição dessas circunstâncias fará com que um mundo novo e melhor para se viver emergirá das cinzas. A situação deste indivíduo é até pior do que a do capitalista insatisfeito. O capitalista insatisfeito pelo menos aprova seu mundo, o revolucionário abomina tudo ao seu redor, entrando em um estado mental de ruptura perpétua.

Ao que tenho percebido aqui, não há filosofia mais sábia que aquelas que nos propõem o desprendimento deste mundo, não de forma tão radical como os orientais, mas de forma prudente como os cristãos. Paradoxalmente, quando nos desprendemos, acabamos lidando melhor com as tribulações deste mundo, parece que observamos e sentimos tudo de uma perspectiva superior, não negligenciando a vida, mas a abraçando de forma a estar protegido de suas possíveis trapaças. Falta este distanciamento para o homem moderno, pois que está a todo tempo estimulado por ilusões, caindo com frequência no turbilhão impiedoso da realidade.

sábado, 21 de abril de 2018

A proteção de interesses e a manutenção da pobreza

Desde o Século XVIII a humanidade já conhece a solução para a pobreza. Talvez tenha demorado para que a solução amadurecesse, mas no fim ela amadureceu, mesmo diante de ferrenhos opositores. Hoje não há mais desculpas para que um país permaneça na pobreza. Nações com recursos naturais escassos prosperaram brilhantemente, assim como povos "iletrados" conseguiram melhorar suas condições adotando instituições adequadas.

Se o Brasil, diante de toda a prosperidade produzida no mundo nos últimos 200 anos, ainda sofre com a escassez, é muito mais por uma questão de manutenção de interesses, e não por meras fatalidades do mundo "subdesenvolvido". Isso porque, aqueles que protegem interesses foram colocados como "amigos dos pobres", enquanto aqueles que sugerem o fim dos privilégios, abrindo mão da demagogia, até hoje são tachados de "elitistas" ou "inimigos da nação".

Quem não quiser cair nesta guerra chula de narrativas, e ao invés disso buscar entender os processos da prosperidade, perceberá que os discursos quase nunca batem com os números, e os números nunca se curvam à pompa dos discursos. Não há um só político que consiga multiplicar a riqueza de uma nação por meio de um decreto, tornando-se capaz de entregar todas as suas promessas populistas a partir do nada. Sempre que um político prometer demais, saiba que você está a frente de um demagogo que, provavelmente, inflacionará a moeda, endividará o Estado ou elevará os impostos até onde não puder mais. Não há mágica.

Nas últimas semanas estive lendo a biografia de Eugênio Gudin, tido como o primeiro economista brasileiro em termos formais (Gudin fundou a primeira faculdade brasileira de Economina), pensava que o Brasil deveria ter disciplina em suas contas, investir na educação básica e se abrir para o comércio com as outras nações. O resultado? Foi acusado de "entreguista" e representante do "grande capital". Apesar de ainda muito respeitado (sendo até o chefe da delegação brasileira em Bretton Woods), Gudin teve suas ideias ignoradas, e o Brasil escolhe o caminho do desenvolvimentismo, que não passa de outra palavra para "gastança de dinheiro que não existe". Hoje somos este país economicamente emperrado, onde tudo gira ao redor do Estado e a instabilidade monetária nunca dá sossego.

Hoje, toda vez que um homem toma a frente propondo austeridade e pés no chão, ao invés de gastança e "investimentos", já busco conhecer mais sobre ele, pois só a coragem de ir contra a maré do populismo já demonstra uma diferenciação quanto aos outros que ocupam os palanques por este Brasil afora. Este país é tão contaminado pela demagogia e pela mentira que fica difícil acreditar que um dia poderemos ter gente responsável ocupando os postos mais altos da nação. Liberar a economia, tanto a interna (regulações excessivas, burocracia e alta carga tributária) quanto a externa (protecionismo) deveria ser prioridade para que um dia cogitássemos acabar de verdade com a pobreza.

sexta-feira, 20 de abril de 2018

Os brasileiros não são democratas

O que prejudica o debate político brasileiro desses tempos é que há um certo desprezo por aqueles de opinião divergente. O brasileiro tem muita dificuldade em ouvir e simplesmente respeitar determinada posição que não esteja alinhada com suas próprias ideias.

Paradoxalmente somos bem tolerantes quanto à pluralidade religiosa, mas extremamente inquietos quanto à heterogeneidade de pensamento político. Observando a democracia francesa, britânica ou americana, nota-se um verdadeiro zelo em proteger o “divergente”, como se o bom funcionamento do “todo” dependesse do atrito mantido pelos “poucos”.

Aqui, se o sujeito fala que é a favor da liberação das drogas, não se conclui que ele tem argumentos razoáveis que fundamentam sua ideia, mas que é um “Zé Droguinha” querendo melhor acesso aos produtos. Se o sujeito é contra o desarmamento, não se pensa que ele refletiu sobre a melhor maneira de termos um país mais livre e pacífico, mas que deve ser algum tipo de psicopata belicista que vai sair por aí aterrorizando tudo e todos. O diálogo fica inviável, os bons se retiram, e a palavra acaba ficando com aqueles que transformam tudo em um grande ringue de calúnias e destruição de reputações.

Este é o cenário ideal para a ascensão de mentes totalitárias, afinal, onde não há diálogo civilizado, haverá o embate pela força, e o embate pela força costuma resultar em um vencedor tirânico o suficiente para calar todas as vozes dissonantes. A democracia parece não ter sido pensada para um munco incivilizado. Quando a voz é concedida a todos e nem todos sabem usar a palavra, o resultado é o caos e a materialização dialética da degeneração. Aqueles que cultivam o bom debate acabam sendo suprimidos por aqueles que passam por cima de todas as regras.

A democracia pode ser bela em um pequeno vilarejo suiço onde todos se conhecem e avaliam as opiniões uns dos outros com respeito e cordialidade, mas em um grande território tomado pelas massas e pela desigualdade, o resultado parece não ser aquele pensado pelos gregos. A tendência é a busca imediata por vantagens, com pouca ponderação e quase nenhuma prudência, sendo necessário algum limite que proteja a liberdade individual.

Entra então o império da lei. Entra então o constitucionalismo. Mas nada adianta uma constituição que não limite o poder da maioria, e que ao invés disso aprofunde a força deste rolo compressor que parece não dialogar com o divergente. Penso que esta é a maior diferença entre a constituição americana e a brasileira, e por motivos de incompatibilidade geográfica e demográfica, considero um erro pensar o que seria bom para o Brasil tomando por referência os países europeus e seus modelos de bem-estar social feitos para uma população homogênea e uma economia já altamente produtiva. Nessas terras selvagens, ou temos lei, ou temos despotismo.