Padaria da comunidade, produção diária 100% orgânica. |
Antes de
falar sobre vida em comunidade, gostaria de falar sobre a vida usual que eu
tinha (e teoricamente ainda tenho) no Brasil. Morava com minha família num bom
apartamento no bairro do Meireles em Fortaleza, eu, meus pais e minha irmã que
há alguns anos também deixou o Brasil, deixando nosso lar mais vazio. Morando
num centro urbano, nunca falta nada, a vida é relativamente boa e nos dá até a
impressão de que somos felizes. Vivemos rodeados de pessoas, de informação, de
movimentação, sentimo-nos como altamente civilizados e envolvidos no mundo e na
sociedade.
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Porém algo
sempre me incomodou neste estilo de vida, pois sempre senti um vazio e um
deslocamento, como se ali não fosse o meu lugar, algo que sempre me inspirou a
viajar e conhecer as opções que eu poderia ter para minha vida mundo a fora. Em
meu lar, apesar de viver em harmonia com minha família, algo estava faltando,
havia algo preso naquele cotidiano, sentia-me confuso, procurando descobrir
porque todos se adaptavam tão bem às suas respectivas vidas e eu nunca
conseguia me sentir estável.
Foi então que
decidi experimentar a vida em comunidade, morando na Escócia, numa comunidade
para deficientes mentais. Um lugar adorável entre as montanhas, adormecido num
majestoso vale, banhado por um rio de águas geladas que penetram em meu quarto
com o pacífico barulho da corrente incessante. Aqui a natureza é tão imponente,
que este jovem da cidade não consegue nem lembrar com precisão a paisagem
urbana. Aqui a vida é tão bonita e radiante que a palavra estresse continua sem
sentido mesmo com qualquer professor Phd tentando explicar seu significado.
Trabalho em Madeira, workshop terapêutico. |
Corbenic,
onde moro, é uma comunidade dividida em 5 casas, Lochran, Mullach, Lindisfarne
(minha casa), Cottage e Turach. Cada uma possui cerca de 8 a 10 pessoas,
incluindo residentes e voluntários não-fixos (eu sou um deles). Minha casa
possui 6 residentes (deficientes mentais) e 4 voluntários, além de
coordenadores e outros empregados que não moram na casa fixamente. Imagine
você, em pleno ano 2012, morando numa casa de 10 pessoas, talvez os seus avós
saberão como é isso, já que na geração deles, isso seria mais normal.
Tente
imaginar esta situação, eu suponho que mesmo com muita força de vontade, você
não consiga ter ideia de como rica e movimentada seria a sua vida,
principalmente porque grande parte da casa seria dependente a você, como você
foi um dia das pessoas que te criaram desde a infância. Morar em comunidade é
simplesmente preenchedor, e depois desta experiência você se pergunta como os
seres humanos estão conseguindo viver cada dia mais isolados um do outro, se
isolando na sociedade e até entre suas próprias famílias, trancando suas portas
para seus semelhantes, sem muito amor restante, sobrevivendo sem brilho e sem
respostas.
A cada dia
que passa neste lugar, onde cerca de 60 pessoas vivem e outras dezenas circulam
voluntario ou profissionalmente, eu concluo mais sobre a reflexão a respeito da
natureza humana, do estilo de vida que deviamos seguir, enxergo que este
período que vivemos, onde as famílias se isolam com medo uma das outras, é só
uma pequena fase de rebeldia da humanidade, que logo logo reconhecerá sua real
origem e se juntará como uma grande rede de paz, amor e fraternidade, onde o
espírito comuntário reinará, e a felicidade se espalhará no coração de cada ser
deste planeta.
Viver em
comunidade é utópico e prazeroso, é criar laços fraternais, é assumir uma
identidade real, é crescer incessantemente e reconhecer que não somos nada
sozinhos. Somos como as células deste planeta, e só entraremos em harmonia
quando trabalharmos juntos para a manutenção de todo o corpo. Uma grande lição
levarei deste lugar e gostaria de mostrar para toda a humanidade, não somos
nada sozinhos, absolutamente nada, se não abrimos nossos corações para nossos
semelhantes, seremos apenas rebeldes nadando contra a corrente do progresso.
Reflita sobre
o que o sistema está fazendo conosco, destruindo nossos laços e impondo uma
ideologia de individualismo e competição, premiando aqueles que rebaixam os
outros, mantendo hierarquias tiranas, maltratando a dignidade humana com a
obsessão doentia pelo lucro, é este o mundo que queremos viver? Existem
possibilidades muito mais compatíveis com nosso nível de evolução, não fechemos
os olhos para o que acontece neste exato momento no planeta Terra, lutemos por
uma nova era de união e progresso.
Voluntários de várias partes do mundo, Yuko (Japão) e Theresa (Áustria). |